11/07/2012 - Uma noite inesquecível

Um poster de campeão com vários jogadores indignos de vestirem nosso manto? Sim, isso foi possível na noite de 11/07/2012.

Nervosismo e ansiedade eram os sentimentos predominantes nos dias que precederam a data de 11 de julho de 2012. Insônia e taquicardia também se fizeram presentes no dias que antecederam a noite épica. O tique do relógio parecia que batia em câmera lenta e toda a distração do mundo não era suficiente para manter a cabeça longe do que aconteceria às 21h50min daquela noite.

Depois de 14 anos, o Palmeiras estava muito próximo de ser campeão da Copa do Brasil novamente e assim ratificar a condição de maior campeão nacional. Na semana anterior ao jogo derradeiro, vencemos o Coritiba por 2 x 0 no pardieiro de Barueri e assim abrimos uma considerável vantagem para o jogo da volta no estádio Couto Pereira - que os minúsculos insistiam em chamar de "green hell" (risos). Mas sabíamos das limitações do time do Palmeiras, que chegou à final muito mais pelo coração e motivação do que pela habilidade - era o pior elenco da nossa história. Por mais que o placar fosse favorável, o jogo de ida foi muito mais difícil do que o placar sugere, não dava para dizer que eram favas contadas e teríamos mais 90 minutos de muita tensão pela frente. O clima prometia ser de guerra.

A cobiça é um pecado capital, mas acredito que 15 milhões de torcedores estavam cometendo-a com a taça da Copa do Brasil. O grito de “campeão” estava entalado na garganta há muito tempo. O sensacional Paulista de 2008 foi uma alegria isolada e subsequentemente sublimada por decepções fortíssimas como o Brasileiro de 2009 e a Copa Sul-Americana de 2010. Estávamos ávidos por uma conquista que lavasse a nossa alma e nos devolvesse o orgulho de estar no topo. O título da Copa do Brasil de 2012 precisava ser de todos os palestrinos.

Foi com a ideia de que seriam 90 minutos tensos que embarquei no metrô rumo à estação Palmeiras-Barra Funda para encontrar amigos palmeirenses e assim termos uma das noites mais felizes desde que nos conhecemos em 2006 e passamos a torcer juntos. Apesar de frequentar arquibancadas desde 1999, foi a partir do ano de 2006 que ganhei grandes amigos na arquibancada, desses que podemos dizer que é para a vida também. Nem todos estavam ali, alguns conseguiram ir para Curitiba e outros assistiram em locais distintos ao que iriamos assistir.

No caminho deu para sentir a mesma tensão que eu estava sentindo em outros palestrinos que também rumava para a região da Rua Turiassu, o único lugar apropriado para que pudéssemos acompanhar esse jogo, local que abriga o Palestra Itália, de tantas glórias, histórias e que naquele momento estava passando por uma reformulação – e ainda está. Ao mesmo tempo eu via que a cidade também estava sendo pintada de verde, mais do que o usual em nossos jogos, comum em decisões do Palmeiras, algo que não deveria ser incomum nos últimos anos.

A verdade é que não tínhamos ideia de qual bar veríamos o jogo. A ideia inicial era que veríamos o jogo no L’Osteria, um reduto palestrino na esquina da Rua Turiassu com a Caraíbas, mas mesmo chegando com muita antecedência, o local já estava abarrotado e era bem possível que veríamos o jogo em pé e esmagados – para um lugar não muito grande e fechado, podemos dizer facilmente que isso não é uma boa pedida. Rechaçamos rapidamente a ideia inicial e decidimos ir a outro local. 

Depois de rodar por quase uma hora, subimos a Rua Caraíbas e fomos para a esquina da Rua Maringá com a Rua Caraíbas, na Fábrica Pizza e Bar. Chegamos por volta das 21h e ali também já estava tomado por palmeirenses. Apesar de toda a aflição que assolava a coletividade palestrina, era um clima maravilhoso, eu me senti muito bem ali. Senti-me em casa.

O fato curioso é que conseguimos uma mesa bem localizada, em frente ao telão instalado. Aparentemente estava reservada, mas quem efetuou a reserva não apareceu e assim os lugares foram cedidos para o nosso grupo - pura coincidência, mas se as pessoas chegassem, levantaríamos tranquilamente, afinal, apenas queríamos ver o jogo juntos, não importava como. Então ficamos alojados na mesa e pedi cerveja para ver se meu sistema nervoso tivesse um mínimo de relaxamento naqueles minutos que precediam a partida. Claro, nada do que eu fosse beber ali iria aliviar a tensão.

Novamente observei o ambiente ao redor e por mais que todos ali estivessem esperançosos, não era difícil deixar de notar a tensão no semblante de cada palmeirense presente naquele local. Tínhamos razões para estarmos nervosos, afinal, o time chegou a final superando diversas adversidades e mesmo no jogo final teríamos um time esfacelado, com desfalque de alguns dos principais jogadores e mais uma vez teria que jogar muito mais com o coração do que com a técnica. 

Antes de a partida começar, entoamos o hino do Palmeiras, ritual pré-jogo corriqueiro (e sempre prazeroso) para quem frequenta a arquibancada e assim que soou o apito inicial a tensão atingiu um pico acima da média. Teríamos 90 minutos para saber se gritávamos “campeão” ou se nos decepcionaríamos outra vez. A história recente nos ensinou a mantermos os pés no chão, mas aquela noite era especial, iriamos gritar “é campeão” a todo custo. Era o nosso destino.

Já no primeiro tempo era possível ver pessoas chorando de desespero, especialmente quando o Coritiba exercia alguma pressão. O inverso também ocorria e o Palmeiras criava algumas chances de perigo, em especial com cobranças de falta do capitão Marcos Assunção. Em uma jogada especial, Betinho apareceu livre e perdeu um gol feito, algo que levou os palestrinos locais a loucura. Apesar de vários arranhões, o jogo foi para a pausa com 0 x 0 no placar. Estava em nossas mãos e ainda teríamos mais 45 minutos.

Atmosfera palestrina. Era tudo nosso, não tinha jeito.

Veio o intervalo e pedi mais cervejas para mais uma tentativa de me acalmar, meu sistema nervoso já estava em frangalhos, mas conseguimos relaxar um pouco e assim me preparar para os minutos derradeiros. Não havia muitas conversas, talvez estivéssemos falando, mas não me lembro com precisão.

E não seria sem sofrimento. Antes dos 15 minutos o Coritiba foi para o tudo ou nada e Lincoln, um dos jogadores símbolos do fracasso do Palmeiras no ano anterior, sofreu falta na intermediária. O lateral Ayrton cobra com precisão e acerta a meta de Bruno. 1 x 0 para o Coritiba.

O clima no Fábrica passou a ser de consternação total. Não dava para dizer pelos outros, mas passou um filme em minha cabeça de todos os anos que tropeçamos em times insignificantes, que perdíamos para nós mesmos. E estávamos por apenas um gol, algo perigoso demais e que poderia ter consequências desastrosas caso o Coritiba se inflamasse ainda mais e o Palmeiras aceitasse passivamente o jogo deles.

Mas não era dia do Palmeiras perder o título, aquela era o nosso dia de gritar “é campeão”.

Quis o destino que o herói daquela noite fosse alguém que criticamos de maneira feroz (e bem justa, é bom que se diga) a contratação alguns meses antes. O herói que substituiu o artilheiro do time que estava acometido com apendicite. O herói que desviou o cruzamento preciso do capitão Marcos Assunção e empatou a partida no Couto Pereira. 1 x 1 e Betinho gravou seu nome na história do Palmeiras.

O Fábrica foi a loucura. O nó na garganta que tinha durante os dias que precederam se desatou e enfim desabei no choro, assim como muitos outros palmeirenses que estavam ali. Eram diversos abraços emocionados e eu soluçava, junto com outros. Eram os demônios dos anos anteriores que finalmente estavam sendo exorcizados naquela noite.

Faltavam ainda cerca de 20 minutos para o jogo terminar, mas a vantagem havia voltado para o nosso lado. Graças a regra do gol fora de casa, o Coritiba precisaria fazer mais 3 gols para se sagrar campeão. O jogo estava acabando ali e a contagem regressiva começando. 

Meu choro durou uns 5 minutos após o gol, mas na medida em que fui me acalmando, via o relógio andar e quando me dei conta, já eram 35 minutos do segundo tempo e gritos de “campeão” começavam a ecoar pelo local. Estávamos nos sagrando bicampeões da Copa do Brasil, ocupávamos nosso lugar de direito, que é de gigante e colocávamos o Coritiba em seu devido lugar, de time médio, insignificante.

Veio o apito final e de maneira legítima gritamos:

É CAMPEÃO! É CAMPEÃO!

Minha garganta já estava cortada em meio a tantos gritos, lágrimas e soluços. Em meio a tantos percalços durante a caminhada da Copa do Brasil, fomos merecedores desse título. Não éramos os favoritos da imprensa, não tivemos apoio midiático e nem transformaram nossa paixão em algo artificial. Era tudo genuíno, verdadeiro e feito com muito amor. E veio com diversos contratempos, que só engrandeceram a nossa conquista.

A comemoração prosseguiu noite afora. Hasteamos as bandeiras que tínhamos ali e descemos a Caraíbas rumo a Turiassu gritando “é campeão”. Um orgulho resgatado e a cidade novamente estava pintada de verde.

Infelizmente, esse título não foi o suficiente para que o restante do ano fosse de alívio, as deficiências latentes do elenco, somadas com a incompetência crônica dos que comandavam o Palmeiras nos levaram para uma triste queda vertiginosa rumo à segunda divisão. Mas independente do que aconteceu ou do que acontecerá, guardarei sempre com carinho esse título de 2012.

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Escrevi esse texto em 2013 para meu blog pessoal, um mês antes de inaugurarmos o Palestra em Campo. Como é um texto atemporal sobre a memória de uma noite inesquecível, resolvi reproduzi-lo aqui para o palestrino que lê nesse espaço. Sei que cada palestrino que vivenciou essa noite tem uma história para contar, essa é a minha.


O grande responsável por esse título tem nome: Luis Felipe Scolari. Especialmente no jogo contra o Grêmio, no Olímpico, ele foi o comandante de mata-matas que conhecemos na década de 90 e fez o Palmeiras (ainda que por algumas noites) ser temido como sempre conhecemos. Nesse momento presente ele pode estar sendo massacrado por diversos setores da mídia pelo desempenho da seleção na Copa do Mundo (algo que, sim, ele também tem culpa) e mesmo por palmeirenses que o culpam pela queda para a segunda divisão (algo que ele também tem sua parcela de culpa, mas não é o único), mas aqui separo o joio do trigo e demonstro minha gratidão por esse momento que ficou para sempre. O grito de campeão é algo que não consigo apagar, ainda mais quando antes desse título, o comandante estava lá em outras conquistas. Felipão, obrigado por esse título improvável.


Aos palestrinos que conseguiram ir à Curitiba: fizeram uma festa linda e calaram aquilo que chamavam de "green hell" (risos). Ver o estádio deles vazio com apenas os palestrinos comemorando foi sensacional, obrigado e parabéns.

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